Piso numas pedrinhas espaçadas no chão, parecem de ferro de tão lustrosas. Passar correndo por ali deve machucar o meio do pé, algumas das pedras são pontiagudas. O céu está azul como nos lindos dias de verão no Rio. O litoral parece não ter mais fim, sigo mais alta que todos, no último banco do ônibus, olhando a água límpida. Não vejo aglomeramentos tumultuados na areia.
Sem meu moleskine perdido, fico um pouco órfã andando sozinha. Desejaria escrever umas notas mas o coração fica apertado de pensar que todas as dos últimos três meses se perderam por aí. O caderno deve estar num limbo aonde meu biquíni azul marinho novo deve ter ido, lá onde dizem residir isqueiros e canetas bic.
Caminhar sozinha por uma cidade estranha dá a sensação de que o tempo é muito maior do que me parece todos os dias. Dou voltas me perdendo, reconheço o Capitães de Areia da adolescência entre uma espiada na procissão que se organiza em homenagem ao São Benedito, o Santo do dia, no meio do dourado de uma dentre as tantas igrejas na ladeira.
Estar só e sem precisar atentar à chamada do celular, alegria com ponto de exclamação. Olhando o mar, no ritmo da Bahia, já com três colares de contas coloridas na bolsa, me dá saudade de quem tem marido, é engraçado pensar nessa minha nova condição. Uma vontade de não ter mais tempo livre só para mim, de querer dividir todos os possíveis com ele.
Pego mais um ônibus dos muitos do itinerário e salto numa sala onde todos os quadros são pisos ou pelo menos me parecem assim. Sou a primeira a entrar no museu com vista para o horizonte infinito. O chão é de tábua corrida, o céu lá fora, repito, é muito azul e o mar agora está transparente.
A escada de madeira, retorcida, me conduz ao pranto. Perco o fôlego de ver o que realmente me importa no mundo, de perceber nas paredes os meus questionamentos de cada segundo em que me permito desacelerar e questionar.
Tenho vontade de rodopiar entre aqueles quadros só meus por um instante, dar piruetas de bailarina sozinha como quem ouve música alta. Fico parada, quanto me basta aquilo de só pensar.
Deparo com uns inscritos despretenciosos, de tina preta, letra de fôrma, na parede branca em frente à segunda igreja do caminho que resolvi tomar novamente.
„Estamos juntos
Condenados a morrer – sozinhos.
Viver junto é um sutil movimento interno do ser
Quando sentimos um leve deslocamento
de um iceberg dentro de nós
Esse movimento tectônico
É saber viver junto
Como também saber morrer – sozinho.“
(Cao Guimarães.)
sexta-feira, maio 23, 2008
Assinar:
Postagens (Atom)