Alice olhava as frestas de sol que apareciam e voltavam a sumir. Ao raiar de uma pequena iluminação que fosse, fixava o olhar naquela luz. Deixava bater-lhe nas vistas tentando buscar alegria em meio àquela mistura de tons de cinza, preto, marrom, bege que correm a cidade. O tempo lá fora da janela do trem, tudo passando e ela ali, nervosa também porque estava com o tíquete errado bem no começo do mês e os fiscais bateriam a qualquer momento, ela pressentia e se daria mal mesmo com todas as desculpas elaboradas na cabeça. Abria um livro para distrair, mas nao conseguia se concentrar, a nuvem negra a rodeava. Por causa dos tais dos fiscais ou sabe-se lá por quê. Ela persistia em busca da saída. Nome mais adequado com que batizaram essa menina que vivia a procurar caminhos mágicos que os espelhos nao ofereciam. Ah, por que nao ofereciam? As lágrimas são difíceis de se conter; ela encostava as mãos geladas do frio nas bochechas quando sentia que a temperatura do rosto ia aumentando. Os olhos começavam a encher de água, ela esboçava um sorriso, último artifício para espantar o choro. Chega uma hora que o corpo precisa pôr para fora todas aquelas dores, a sucessão de decepções. Nao adianta fugir porque nao tem para onde. O corpo fala pela mente, desconcertada, cansada. Apesar do esforço da menina Alice, o debulho, ali mesmo, dentro do trem, nao esperou nem a estação certa para cair. O jeito é saltar, respirar ar gelado, ela gosta de ar gelado. Anda, anda, mas acha desconfortável passear de olhos tão vermelhos e molhados. Vendem de tudo, mas um buraco, o que mais queria, nada. Desejava veemente seu travesseiro, mais que tudo. Tentava pensar em coisas bonitas, mas nao havia saída. Entrou na cabine telefônica. Discou o 0800, quem sabe alcançava alguém em casa, é bom falar com quem se tem intimidade. Depois do alô, o arrependimento. Por que perturbar as pessoas do outro lado do mundo com o seu desespero que nem causa concreta tem?
Nesse mundo quem nao tem objetivo concreto nao é compreendido. Objetivo subjetivo é visto como loucura. Por que morar em Berlim? Você tem que mandar dinheiro para a família? Nao, nao, nada disso, é que... e as lágrimas escorrem, pulam bem de manhã! Como explicar o que faz tão longe? Seria ridículo falar para assistente social que sai-se também em busca de experiências. Nem ela poderia explicar como alguém opta por sofrer, ela mesma nao esperava que atrelada a novas experiências viriam também muitos sentimentos fortes que ficam perdidos, correndo no sangue, subindo e descendo porque o coração nao sabe bem o que fazer com eles. Soubesse dessas emoções todas talvez... Talvez nada porque quando eles passam, viram ótimos sentimentos. È assim que se constituem as experiências, conclui. Ai, mas nao tinha jeitinho melhor? Tudo culpa da Narizinho que quando Alice tinha dez anos lhe contou que havia um reino no fundo do mar maravilhoso, onde tinha um caracol gente finíssima, com tantas histórias, valia a pena conhecê-lo. Se Narizinho conseguia fugir para volta e meia encontrar seu amigo, que beleza!, ela também podia. Nao só esse reino era alcancável, muitos outros também, era só tomar o tal do pó de pirlimpimpim. Alice queria esse pó agora, o coelho sumiu e levou seu chá! Como achá-lo para conhecer novo reino?
O coelho sumiu porque queria ensinar a Alice que nesse reino esquisito é bom estar concentrado no mais alto grau, nada de perder tempo em tardes de chá e bate-papo com ele.
Deixou Alice a ver bicicletas até que ela decida escolher uma para ela e saia a pedalar por aí sem errar o caminho. Prometeu aparecer qualquer dia.
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2 comentários:
eu me recuso a ler ou a comentar seus posts enquanto vc não comentar os meus.
Falta de consideração!
tudo ben]m, agora sim: Adorei! Saudades loucas.
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