domingo, janeiro 21, 2007

à flor da pele

Tento matar o tempo dentre essas quatro paredes
Hoje resolvi não sair de casa
O tempo está chuvoso, é frio lá fora
E sozinha com essa paisagem à janela não resisto ao vício

Disco o número de cor
Você atende com aquele sotaque que adoro
E já na primeira frase eu me derreto a imaginar você de bermudas e havaianas
andando na areia com sua garrafa d´água de dois litros

Me ponho a pensar em como se vestiria no calor
E acho graça.
Penso em te chamar para ir a um show comigo
Mas acho melhor não, seria muita audácia.
Eu podia inventar que ganhei um ingresso. Besteira!

Volto para nós de mãos dadas matando o tempo juntos
Debaixo do edredon quentinho.
Vejo-me lendo Schiller em voz alta de calcinha
num domingo igual a esse
Você caçoa do meu sotaque e me corrige.
Eu te ensino espanhol, o domingo vai terminando.

E eu te chamo para assistir a um filme.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

.pelas ruas.


Um viva à diversidade sexual berlinense!

Saudades do sol do outono!... Prédio em Neukölln.

terça-feira, janeiro 16, 2007

E.T.

Na escrivaninha duas canecas coloridas daquelas que se ganham de brinde, uma cheia, outra vazia. Cappuccino em pó era o que resolvera experimentar na última ida ao supermercado.
Nao estava exatamente bom, mas também nao era de todo ruim. Pensava na praia e na data do carnaval que pela primeira vez ela nao sabia quando era. Pra quê? Tao longe.
Acabara de voltar de uma reuniao no planeta marte – assim imaginara. Se o povo moderninho da terra dela já era meio over de vez em quando, que dirá esses por essas bandas. Blusas coloridas por baixo de ternos cinzas de corte clássico, brincos em lugares nunca d`antes pensados, botoes eletrônicos de diversas cores, fios e mais fios, monitores plasma, câmeras prateadas! Era 2046? Indagava a si mesma e ria ouvindo Alfie, novo álbum do Sonny Rollins no seu ipod shuffle. Nao ligava muito para a música, colocou os fones brancos como velhinhas esquecem a TV ligada: um hábito para fingir que há possíveis interlocutores pelo caminho.
Marcianamente feliz, pensa que nao tendo consciência do que se passa naquele planeta do outro sistema solar talvez seja possível ser completamente feliz por cá.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Que saco o individuo pos-contemporaneo

A gente sempre sabe o que o outro quer, mas finge para si mesmo que nao sabe na esperanca de descobrir que o querer dele é o nosso desejo. Mas as pessoas podem querer num dia uma coisa e no outro, outra. Podem nem saber o que querem. Quando nao sabem o que é levar um pé na bunda, pior ainda. Nao um qualquer, mas daqueles bem no meio, em cheio. Pé na bunda é transformador, ajuda o sujeito a tomar decisao em relacao aos seus próprios sentimentos futuros. Esse negócio de ser confuso nao tá com nada.

domingo, janeiro 07, 2007

Privat Party

Caía aquela chuva fininha e gelada típica de Berlim e nós duas em busca de um Imbiss turco aberto para comprar cerveja para levar para a festinha. Uma „privat party“ como chamam.
No Brasil minha saída preferida sempre foi para as festinhas nas casas de amigos, às vezes duas, três por noite, às vezes semanas sem nenhuma acontecer. Nos últimos tempos era só isso o que eu fazia à noite, beber no Braseiro, BG, boteco da esquina, Lapa e festinhas. Showzinho de vez em quando também não ia mal.
Em Berlim, a rotina noturna começa a ser de festinhas em algum lugar da cidade na casa de algum fulano que eu geralmente não conheço muito bem ou nunca vi na vida.
Como de hábito, catávamos uma rua X paralela à rua Y. Na raça, sem carro, andando na chuva carregando seis garrafas de Berliner Pilsen cada uma.
Ufa! Chegamos. Lá pelo terceiro lance de escada, ouvimos música eletrônica alta. Eu: Hum, parece animado né? Ela: Aposto que a gente vai entrar e vai ter um monte de gente sentada na cozinha comendo macarrão.
Não deu outra. Na cozinha, até que tinha um monte de gente em pé, mas o super pote de salada de macarrão imperava no meio dos pães, pastinhas e falafels. Claro que todos estavam enfurnados na cozinha. Esse é geralmente o lugar preferido, mas aqui ainda mais, porque os apartamentos não tem sala.
A cerveja é sempre temperatura ambiente, porque imagina se alguém vai se preocupar em preparar baldes de gelo para gelar a bebida!... Para quê?
Uma coisa eu guardei e vou copiar no meu próximo aniversário com festa: a aniversariante estava de asinhas e coroa. Adorei!

quinta-feira, janeiro 04, 2007

Auto-ajuda

Sua vida é um filme e você, o ator. Na verdade aquela situação que você está vivendo é temporária, você está dentro de uma história afinal. Precisa se preparar para entrar em cena. Está ensaiando para logo ser outra pessoa. A partir do ação, tudo muda. Sua voz, seu jeito. Você não é mais você. Você é um outro alguém, com outro passado, outros objetivos e projeções. Você faz coisas que nunca faria se fosse você. Esse jogo é cansativo, de vez em quando você sente falta de você, mas prefere não pensar nisso porque atrapalha a atuação.

segunda-feira, janeiro 01, 2007

PORMENORES do reveillon em Berlim


Sabe que eu esqueci de comemorar a meia-noite no horário do Brasil?? Mas também eu ia parecer uma louca gritando sozinha na rua. Quer dizer, mentira, vários loucos gritando sozinhos na rua ontem...
Minha noite foi linda, mas eu realmente percebi que estou envelhecendo. Sempre tive complexo de ser mais velha do que eu sou, um complexo de filha mais velha.Ontem foi talvez a primeira vez que tive consciência do que é crescer. Engracado isso ter acontecido logo na virada do ano. E nao é ruim nao, é bonito perceber que nossos gostos mudam, a gente amadurece. Deu saudade de ser adolescente!..., de gostar de alguns perrengues que nao me pegam mais.
Comecei o dia de revéillon às 14h30 para comer em algum lugar porque nao tinha nada aqui em casa e dia 31 em Berlim nao tem nenhum mercado aberto. O comérico por aqui funciona pela metada nessa época do ano. Férias entre natal e revéillon. Vêm turistas para cá mas neguinho nao quer nem saber, nao trabalha nessa época e pronto. Justo!
Fui me encontrar com a Alice e escolhemos um restaurante indiano. Uma delícia esses vários restaurantes de imigrantes. Cada dia eu como em um diferente. Comidas deliciosas e baratíssimas. Com os turcos eu parei porque é sempre o mesmo gosto.Descobri que na verdade, nos indianos também. O mesmo tempero. Assim como os vietnamitas/tailandeses, minha comida preferida. Nao fui ao „Vietna“, como eu chamo o vietnamita que freqüento porque sabia que estava fechado.
Nos indianos o cardápio tem sempre 700 opcoes de pratos! Nao é brincadeira, os pratos sao numerados, ontem havia 345 opcoes no menu. 345!! Só pode ser estratégia de marketing deles para termos a sensacao de estar sempre experimentando uma comida nova. O cliente fica perdido, lendo e relendo aquilo tudo sem conseguir se decidir. Acabou que Alice pediu o prato 30 e eu o 272. Veio a mesma coisa com a sutil diferenca de três raspinhas de avela sobre os meus legumes, o resto era igualzinho. Constatamos que eles têm um panelao de arroz amarelo e uma de legumes e é isso aí. As 345 opcoes sao engana-trouxa. De qualquer forma, estava tudo uma delícia. Bebemos uma Warsteiner vom Faß (tipo chopp) enquanto ela me contava da viagem para Antuérpia e Bruxelas. Foi com o namorado para lá no natal e voltou ontem mesmo, um pouco antes do nosso encontro. Eu fiquei contando as poucas novidades de Berlim na ausência dela.
De lá viemos para casa tomar banho e nos prepararmos para a festa! Horas a fio para escolher uma roupa. Como é difícil escolher uma roupa de revéillon no frio. Nao queria ir de preto, mas as minhas opcoes de casacao sao cinza e preto. Fui de preto, mas com uma blusa dourada por baixo e um casaco puli vermelho, cor do amor. Agarrei-me a esse vermelho aí. A calcinha foi amarela, mas meio desbotada, nao sei se isso é um bom sinal.
Enquanto Alice se arrumava na casa dela fiquei conversando com a galera que ela mora (dois nerds da informática, mas do bem!) e bebendo whisky.
Partimos animadas para casa do Fabian em Neukölln. Os fogos estourando pelas ruas. Aqui a mania é qualquer um soltar fogos! Faz parte da cultura. Pais ensinam as criancas como fazer. Me dá medo. Pelo menos nao é pior do que em Amsterda, onde entrei em pânico.
Neukölln é uma área mais fudida daqui de Berlim. Nao é bairrozinho da moda. Moram muitos turcos e também uma pequena galera muito alternativa. Mas nao os alternativos hypes. É difícil explicar isso, sao os alternativos que nao querem seguir as tendências dos alternativos normais. Ai, deixa para lá.
No nosso trajeto resolvemos comprar red bulls gelados para misturar com o Ballantines e ir bebendo. Porque beber cowboy tava ruim e comprar gelo em Berlim dia 31, impossível. Fomos tagarelando até chegar no Hermanplatz onde paramos para comprar cerveja para levar para a festinha. Dizem que essa praca é perigosa. No entanto, sem mais pudores, nos sentamos no banquinho no frio a beber nossos whiskies com red bull e desatamos a falar. Sobre o Rio, projetos para 2007, nossa vontade de fazer alguma séria pelo nosso país, nossa eterna condicao de imigrante aqui, eu contei dois roteiros que acabei de escrever, Alice dos palcos que quer montar por aí.
Até que a gente se tocou que estávamos as duas bêbadas sentadas num banco de praca às 21h do dia 31, e ainda por cima com sacolas plásticas cheias de cerveja e com duas garrafas de whisky.
Levantamos e continuamos o trajeto. Eu ainda insisti para passar no banheiro do Mc Donalds, mas Alice me garantiu que a casa do Fabian estava a uma estacao de nós, era ali do lado. Obviamente pegamos o metrô para o lado errado, saltamos, tivemos que voltar e: casa do Fabian. Estava ele, a namorada e o Piti, Mitbewohner dele. Já estávamos bebinhas e alegres. Eles ainda comecavam a noite conversando na cozinha.
Tome whisky até que o Piti surge com um jogo que foi dos avós dele. Umas cartas com perguntas e outras com respostas. Um jogo alemao dos anos 60 para fazer as pessoas se conhecerem. Foi tao engracado! Cada um tirava uma carta de pergunta e apontava quem deveria responder. O escolhido respondia com uma carta também. Super divertido, Até que chegou uma galera. A Sabine, ex-Mitbewohnerin da Alice e do Fabian. A Alice morou com o Fabian e com o Piti, daí a origem desse povo todo. Sabine vem com uma galera.

Convesamos à beca na mesa, à beca. Eu nem sei o que tanto falei. Contei pro Piti do meu natal em pormenores e ficamos ouvindo música eletrônica alema em K7. Mania de berlinense cultivar hábitos antigos e guardar velharia. Curto. Como assim ouvir cassete? Ando tao acostumada a ver coisas esquisitas que na hora me pareceu super normal aquilo. Só agora que me toquei da estranheza. Estávamos ouvindo música gravadas em cassete.

As pessoas bebiam drinques. Eu e Alice continuávamos no whisky. Até que o Fabian surge da dispensa com uma caixa de fogos. Eba, vamos lá para fora! - gritei animada. A princípio tínhamos combinado de ver os fogos no Hermannplatz, a tal da pracinha perigosa que fica ali perto. Mas enrolamos tanto que acabamos indo às cinco para meia-noite para a rua, e ficamos ali na porta do prédio.
Os fogos estouravam bonito. Todos saíram de suas casas e ficaram ali vendo e soltando-os também porque aqui nao tem uma prefeitura responsável por eles. Foi bonito todos felizes pela rua. Eu nem olhei no relógio, mas sei que em algum momento comemorei a meia-noite. Muito. Pulei de um lado a outro da rua, abracei uns turcos, fiz um turco e um alemao na porta do prédio ao lado se abracarem. Nessa hora peguei a câmera e comecei a clicar. Fiz questao de registrar o abraco.

Tudo muito lindo nao fosse eu e Alice no auge da empolgacao, depois de cairmos no chao algumas vezes, rolarmos na merda sem perceber. Sim, rolei na merda na virada. A gente se abracou tao forte que caiu. Num canteiro de terra que tava cheio de merda. Parece. Eu nao vi. Disseram-me. E eu senti o cheiro de merda na barra da saia depois. E lavei-a na pia. Ainda bem que foi só na barra. Com a Alice foi o casacao. Que ela lavou e deixou no Heizung até a gente partir.
Conversamos mais um monte lá dentro depois desses fogos todos. Ah! Esqueci de contar que depois de entrar o ano na merda, o Piti ficou me ensinando a soltar fogos e destemida que estava acendi vários. Acabamos com a caixa, foi uma delícia! Vinícius tinha razao quando dizia que whisky é um cao engarrafado. No final Alice estourou um na mao, mas nem sentiu. Ficou tudo bem, só susto mesmo.
De volta à cozinha, Sabine desata a me contar de um porco „tradizionel gemacht“, receita da família dela que eu e Alice estávamos convidadíssimas, ela queria muito apresentar o prato para a gente. Estava tao animada que fiquei com pena de falar que sou vegetariana. Ela descrevia-me com detalhes como eles abrem o estômago do porco, retiram tudo, enchem com carne de outros animais e depois costuram de volta. Fez questao de reforcar que só se pode comer esse prato em casa, nao em restaurante. Obrigada, eu já estava com o estômago embrulhado de qualquer jeito. Já nao sei que tantas da manha eram e eu queria dancar de qualquer jeito. Depois de muitas tentativas conseguimos partir. Eles e a gente nao parávamos de falar e se a gente nao tomasse uma atitude nao sairia dali. Fomos. A gente nao sabia muito bem para onde, mas íamos.
Na estacao, dois alemaes de Bodensee perdidos vêm perguntar para gente onde ficava a rua tal. Nao fazia a menor idéia, mas eles garatiram que lá tinha uma „Haus party“. Opa, festinha é com a gente.
Entramos no trem sem saber para onde a gente tava indo. O problema é que ninguém sabia nem em que estacao a tal da rua ficava. Fomos simplesmente indo até perceber que estávamos nos emburacando pela linha U8 que dá em lugares nao muito agradáveis. Os alemaes de Bodensee estavam super seguros ao lado de duas cariocas manjadas em Berlim.
Desistimos da festa, voltamos o caminho e decidimos: Panorama Bar. Panorama nunca é ruim. É um bar, clube de música eletrônica incrível daqui. Comeca a ficar bom umas quatro da manha e quem tiver arrumadinho demais nao entra. Pode? Cool é ser meio rasgado, descombinando. Enfim, estávamos indo para o Panorama, os meninos comecam a conversar com os caras do banco ao lado. Tava esse clima todo-mundo-fala-com-todo-mundo. E acabou que saltamos no Alexanderplatz e deixamos eles para trás sonhando com a nossa pizza da minha Guanabara daqui, um italiano na minha rua que fica aberto 24h e todos os pratos sao feitos a mao e na hora. Da Guanabara só o timing mesmo porque o público freqüentador é só da galera da rua e dos aposentados e desempregados alemaes que adoram ficar papeando com o dono ou com seu filho.
Foi comendo a pizza de Mozzarela com o, como eles chamam a Marguerita, que percebi mais uma etapa da vida se passando. Eu e Alice desistimos de ir ao Panorama porque imaginamos a fila na porta na noite de revéillon, aquele perrengue para entrar e gastar dez euros e mais as bebidas, nao, vamos para casa. Nesse momento senti saudades dos meus dezoito anos. Falei que estava me sentindo velha e Alice para me consolar, dizia que eu nao arrajaria um marido no Panorama de qualquer jeito.